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Perfil do Servidor

Claudinei Garcia

Técnico de Laboratório do Campus Corumbá, ex-aluno do curso técnico integrado e atualmente estudante de graduação no IFMS
por Paulo Gomes publicado: 14/11/2017 08h50 última modificação: 23/02/2018 11h50
IFMS

Ele tem um jeito simples e, ao mesmo tempo, metódico de conversar, tentando explicar todos os detalhes das ricas histórias que viveu. Claudinei Garcia é técnico de laboratório no Campus Corumbá e querido pelos estudantes, que já entram no laboratório fazendo piada e pedindo orientações.

Mas o cargo que ele atualmente ocupa está bem longe de definir o quão intima é a relação dele com o Instituto Federal de Mato Grosso do Sul (IFMS). Estudante desde 2011, já se formou no curso técnico integrado de Metalurgia e agora cursa o superior de Tecnologia em Processos Metalúrgicos.

Nestes seis anos de Instituto, passou por experiências pessoais que reforçaram os laços com a instituição. A morte do pai, a viagem para a Bolívia para apresentar trabalho científico e o concurso para técnico-administrativo são alguns dos momentos que tornam a história ainda mais interessante.

Leia a entrevista, realizada no laboratório em que Claudinei trabalha em Corumbá, e saiba mais sobre esse nosso colega de trabalho.

Como foi sua chegada ao IFMS?

Em 2011, eu tinha acabado de me formar em técnico em Mineração, mas buscava mais aperfeiçoamento profissional na área industrial, então participei da seleção do IFMS para o curso técnico integrado de Metalurgia. Eu me interessei, fiz a prova, que foi bastante difícil, e consegui a minha aprovação em segundo lugar, e me tornei o estudante mais velho a cursar o técnico integrado. Entrei aqui com 34 anos e muita gente questionava isso. Eu já tinha o ensino médio, mas fiz de novo para ter mais capacitação para enfrentar o mercado. Na época, eu tinha um cara que me ajudava muito, meu pai, que faleceu em 2015. Ele me falava que, se eu queria estudar, eu devia estudar. "Você tem seu pai", ele dizia. O curso é puxado, difícil. Ou você estuda ou você trabalha. Porque, além das aulas normais de manhã, tem que fazer o reforço à tarde.

Você conseguiu conciliar trabalho com estudo?

Eu parei de trabalhar durante quatro a cinco anos, porque me dediquei ao estudo. Meu pai permitiu isso. Ele disse "enquanto você tiver pai, você tem tudo". Ele me incentivou. Na época ele ficou doente e eu cuidei dele.  Daí ele faleceu.  Então, fiquei numa situação, sem chão, tive que me virar. Na época, abriu concurso para o IFMS e eu já estava terminando o curso técnico. Formei em setembro e fiz o concurso para servidor. Tinha uma vaga e consegui passar em primeiro lugar. Neste mesmo laboratório onde eu estou, onde trabalho, fiz meu TCC [Trabalho de Conclusão de Curso]. Ficava aqui da uma da tarde até as 10 horas da noite. Muitas vezes eu fechava a instituição junto com o guarda. Eu esquecia que estava aqui.

Na época, eu fui a um congresso de metalurgia na Bolívia apresentar o meu TCC. Eu recebia bolsa de iniciação científica, pois já estava no superior de tecnologia em Processos Metalúrgicos, aqui no IFMS também. Foi nesse período que abriu o concurso, tudo em 2016, de junho a dezembro. Mas eu atingi meus objetivos.

O IFMS tem uma participação muito forte na sua vida então?

Sim, muito forte, desde 2011. Entramos 45 estudantes no técnico integrado e formamos 15. Os formados foram aprovados em concursos da Marinha ou estão trabalhando.

Você, que passou por toda essa experiência, pode dizer que o IFMS está fazendo a diferença na vida dos estudantes em Corumbá?

Posso falar, com certeza, pela minha turma, que estamos todos trabalhando. Do meu ponto de vista, as pessoas que perseveraram e conseguiram a sua formatura, tiveram sucesso. Nesse sentido, o Instituto ajuda. Inclusive, a última turma aqui do IFMSconseguiu 50% das vagas da seleção para a marinha.

Além dos conhecimentos do dia a dia, o que você passa para os estudantes aqui no laboratório?

A primeira coisa que eu falo é "Não desista". Mesmo que demore, mesmo que sua meta passe de 2 para 4 anos, mas o sucesso é chegar no final. O sucesso não está em você terminar um curso em tempo recorde, o sucesso é alcançar sua meta, não importa o tempo que exija.

Como foi a sua infância?

Minha infância até os dez anos foi normal, como a de qualquer criança. Mas na quinta série, eu tive um chamado vocacional. Frequentava a escola salesiana de Corumbá, era coroinha, cantava na missa. Na época, o padre pediu para minha família que eu fizesse um pré-seminário. Fiz da 5ª à 8ª série numa escola em Araçatuba, me preparando para a vida sacerdotal. No segundo grau, eu continuei estudando em escola católica aqui em Corumbá, na Santa Tereza. Eu aprendi valores católicos que tento preservar até hoje.

Sua família é boliviana? 

Sim. Meu pai veio para Corumbá com 10 anos de idade, em 1947, e trabalhou como padeiro, vendia pão no Porto Geral, viveu até os 15 anos trabalhando só para comer. Ele acordava de madrugada, não tinha estudo. Depois, ele foi trabalhar em um bar, até os 18 anos. O dono explorava ele também, trabalhava em troco de comida. Esse dono reconheceu o trabalho dele e tentou adotá-lo, mas não deu certo por conta de briga de herança. Depois ele tentou servir o exército no Brasil, mas como ele não tinha documentos, precisou da ajuda de amigos militares, que ajudaram a tirar os documentos. Então conseguiu entrar.  

Aqui ele conheceu minha mãe, que era do norte da Bolívia, e fez a vida. Eu também morei fora de Corumbá, em Fortaleza. Era aprendiz da Marinha. Mas minha mãe faleceu e eu voltei para cá. Meu pai falava que Corumbá era o lugar dele. Ele não ficava três dias longe, nem pra visitar a família, a mãe dele na Bolívia. Ele sempre trabalhou como pedreiro e mestre de obras. Construiu várias escolas e a maternidade de Corumbá.

Depois que ele ficou velhinho, doente, eu cuidei dele. Depois que ele faleceu, me faltou chão. Mas, nesse momento, o Instituto foi tudo para mim, em 2016.

Por que seu pai veio pra Corumbá sozinho com dez anos?

O nome do meu pai é Manoel Garcia, aqui no Brasil, na Bolívia, que ele ouviu os pais dele chamarem ele quando era pequeno, era Diego Guaças. A família não era estruturada, a mãe foi para outra cidade. Os avós que o criaram. Ele foi embora para deixar a pobreza, viajou quase 2 mil quilômetros da Bolívia para cá, trabalhando de graça pelas fazendas, trabalhando com um tio na construção da rede ferroviária que ligava Santa Cruz à Corumbá. Chegando aqui, ele foi adotado por uma família, mas os pais dele aqui faleceram e ele teve que trabalhar. Por isso que ele disse para eu e meus irmãos estudarem. Por isso que eu só comecei a trabalhar depois que eu fiz a minha primeira faculdade, de Ciências Contábeis, aos 24 anos. Fiz cinco anos, mas não concluí, não era o que eu gostava. Me encontrei na área de mineração.

Você acha que seu pai estaria feliz com o que você conquistou?

Eu queria que ele estivesse aqui comigo. Mas quem manda no destino é o cara lá de cima. Se ele estivesse aqui, ele se sentiria feliz na minha formatura.