Você está aqui: Página Inicial > Perfil do Servidor > Luciana Goulart Ferreira

Entrevista

Luciana Goulart Ferreira

Auxiliar em Administração do Campus Nova Andradina desde 2014
por Laura Silveira publicado: 12/06/2017 09h00 última modificação: 13/06/2017 07h23

A positividade e o bom humor são características da personalidade de Luciana Goulart Ferreira, auxiliar em administração do Campus Nova Andradina desde fevereiro de 2014.

Em sua trajetória pelo IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul), integrou a equipe da Coordenação de Materiais e, depois, assumiu a Coordenação de Planejamento e Orçamento, cargo que ocupa até hoje.

"Documentação, papelada, essa área administrativa, a gente acaba aprendendo e resolvendo. Só que os laços fortes que você cria ali dentro transcendem tudo isso", ao comentar sobre as amizades que fez no Campus Nova Andradina.

Atualmente com 42 anos, a servidora está afastada do IFMS para realizar tratamento contra um câncer, que se tornou agressivo, mas não o suficiente para tirar sua força de vontade e fé na vida.

Na entrevista a seguir, Luciana relata experiências marcantes vividas em sua trajetória pessoal e profissional, e revela o que de melhor enxerga no campus: as pessoas que lá trabalham e estudam.

Luciana também compartilha o que a mantém bem-humorada, mesmo nos momentos de adversidade que encara na vida, além de dividir conosco seus sonhos para o futuro.

Confira abaixo o bate-papo na íntegra!

Vamos começar falando sobre onde nasceu, onde foi criada, como foi sua infância...

Tenho 42 anos, nasci em São José do Rio Pardo (SP), onde resido atualmente para realizar parte do tratamento contra o câncer. Minha família é de origem humilde, minha mãe só tem até a terceira série do ensino fundamental, meu pai tem alguns cursinhos de capacitação. Tenho dois irmãos mais novos, sou a mais velha em tudo: primeira neta, primeira sobrinha, primeira filha... Por isso, tentei, junto com minha mãe, assumir a criação dos meus irmãos menores.

Morei em São José até os 6 anos, quando meu pai buscou trabalho na Usina Sérgio Motta, em Primavera (SP), divisa com Mato Grosso do Sul. Ele foi trabalhar lá, ficamos dois anos no Paraná, até conseguir com que a empresa nos transferisse para Primavera, uma espécie de vila operária. Foi lá que passei minha infância. Aos 14 anos, conheci um rapaz e me apaixonei... Imagina, eu ainda era uma criança! Namorei com ele por cinco anos. Quando tinha 19 anos, decidimos nos casar e, logo em seguida, veio meu filho, Bruno - que hoje tem 23 anos.

Qual o seu hobby? Do que você gosta?

Sou bem eclética. De música, eu gosto de MPB. Estou afastada do esporte, mas sempre fui boa nadadora. Já atravessei o Rio Paraná até a ilha nadando. Gosto de filmes e leio muito à noite. Leio de tudo, romance, livro técnico... Também vou ao cinema no final de semana, quando posso.

Como foi sua trajetória profissional?

Durante toda minha vida eu trabalhei. Comecei vendendo celulares, trabalhei no comércio, fui secretária de médico e até empreendedora, durante três anos tive uma empresa de festas infantis. Trabalhava para ter minhas coisas. Depois de dez anos casada, eu me separei. Foi aí que caiu a ficha. Não fiz faculdade porque casei nova, até então só tinha feito o ensino médio. Depois que me separei, fui fazer um curso superior, e comecei a acordar para a área profissional.

Na época, era o segundo ano de realização do Enem [Exame Nacional do Ensino Médio]. Eu tinha 29 anos. Foi um amigo meu que me inscreveu na prova, um anjinho da guarda que entrou na minha vida. Tenho vários anjinhos na vida... Ele fez tudo, inclusive escolheu o curso que eu ia estudar, Administração. Fazia dez anos que eu estava sem estudar, parada no tempo. Tive uma boa educação no ensino fundamental e médio, em escola pública, o que me valeu durante esse período todo. Fiz o Enem e consegui bolsa para duas faculdades, uma para Gestão Ambiental e outra para Administração. Decidi por Administração.

Terminei o bacharelado de Administração de Empresas em 2009, na antiga Finan [Faculdades Integradas de Nova Andradina], hoje Uniesp. Morava em Primavera e estudava em Nova Andradina. Trabalhava o dia inteiro em uma clínica e, à noite, ia pra faculdade. Antes de me formar, em 2010, comecei minha especialização em Recursos Humanos e Marketing, na própria Finan. Parei por causa do tratamento, mas também estou terminando a especialização em Docência para a Educação Profissional, Científica e Tecnológica.

Trabalhei cinco anos dando aulas, para nível médio, técnico e nível tecnológico. Dei aula para o ensino superior também. Eu dava aula de manhã, tarde e noite. Aí me mudei para Nova Andradina, onde moro desde 2010.

O concurso do IFMS surgiu como?

Eu já queria prestar concursos, até que uma amiga me indicou o do IFMS, falou que eu não precisaria me deslocar de cidade e ficar longe dos meus pais, que são idosos. Tomei posse no Instituto no dia 14 de fevereiro de 2014 e iniciei minhas atividades no dia 17, como auxiliar em administração.

A experiência inicial no Campus Nova Andradina, uma unidade agrária, foi diferente?

Foi sim, e vou ser super sincera: estranhei a distância. No verão é muita poeira e, no inverno a gente atola. Só reclamo da distância e das condições da estrada. Isso deu uma grande virada com a administração do Cláudio [Claudio Zarate Sanavria, diretor-geral do campus], que conseguiu mudar parte do ensino para a cidade, o que auxiliou nosso trabalho.

Mas o campus é lindo, é verde, muito bem equipado, bem distribuído. Há pessoas educadas, respeitosas, esse é o ponto forte. Só tenho a agradecer pelo calor humano daquele ambiente. O que o IF tem de melhor? As pessoas que lá estão. Sempre vivi situações de extrema rigidez com chefias, e trabalhei ao lado de pessoas que não queriam ajudar. Quando cheguei no IF, levei um susto nesse sentido. As pessoas são camaradas, te ajudam, param o que estão fazendo pra te auxiliar no que você precisa. Levei um choque cultural muito grande.

Comecei em uma área que eu desconhecia totalmente, não tinha preparo algum. Entrei direto pra a Comat [Coordenação de Materiais], pra ajudar a fazer pregões, licitações. A minha antiga chefe, Rosi – hoje não mais servidora do IFMS – , sou grata do dedinho do meu pé até o último fio do meu cabelo - que eu ainda não tenho, mas que vai nascer - porque ela foi uma chefe totalmente humana, me capacitou.

Fiquei na Comat até janeiro de 2016. Aí fui convidada a assumir o cargo de coordenadora de Planejamento e Orçamento, na Copor. Outro desafio, porque você tem que compreender as contas da União, fazer registro contábil, relatório de execução, tinha toda uma dinâmica de documentos. Foi aí que veio uma outra fase maravilhosa da minha vida, porque o meu chefe ali, o Sérgio [Sérgio Paulo de Souza, diretor de Administração do Campus Nova Andradina] foi meu amigo de longa data, da época da faculdade. Ele é muito, muito humano. Apesar de ser uma pessoa extremamente correta com documentação, tinha paciência de me mostrar meus erros. Ele me ensinou tudo que eu precisava saber.

Como é seu relacionamento com os servidores e estudantes do campus?

Uma coisa que prezo é a boa comunicação. Isso auxilia em qualquer atividade. Gostava muito de estar em contato com os professores. Não conheço todos os alunos porque eles vivem numa dinâmica diferenciada da minha, mas fazia o possível para conversar com eles. Isso é algo meu, gosto de me comunicar. Fiz grandes amigos no campus.

Já fiz curso de pregoeiro pago pelo Instituto, curso de idiomas, capacitações, ajudava no cerimonial, ainda estou coordenadora adjunta do Pronatec, ajudei em processos seletivos, atividades extracurriculares, projetos de pesquisa... Gostava de participar de tudo. Sempre fui muito ativa e dinâmica para essas áreas. Não porque eu precisava, porque é da minha característica estar presente, gosto de estar em atividade e movimento.

E olha, apesar de estar afastada, continuo lendo os e-mails. Quero que as pessoas estejam em contato comigo pra eu saber o que está acontecendo no Instituto.

Tem algum fato que mais te marcou até hoje? Seja uma pessoa, um acontecimento, um evento...

Posso enumerar vários que me marcaram. Quando eu precisei ir ao médico, ninguém nunca se opôs. Quando eu tinha um problema administrativo, se não entendia um documento, sempre a pessoa exata no momento certo me explicava. O carinho que as pessoas têm por mim lá me surpreende.

No dia da minha cirurgia, o campus enviou a psicóloga Gessyca [dos Santos] , a assistente social Roberta [Tropaldi], e a Daniela [Santi], que é enfermeira. Elas vieram e me deram tanto suporte! Me deram valor e foi tão bonito que eu não acreditei que um órgão federal faria isso por mim. Sou apenas uma auxiliar que coordena um setor. Elas me trouxeram luz! Aquilo me emocionou muito. Esse é o fato mais recente que posso citar.

As situações que mais me marcaram foram situações em que eu estava em risco e ninguém me virou as costas. O cafezinho da tarde, aquela roda de conversa rápida que a gente interage... E não importa quem esteja lá, seja terceirizado, técnico, professor, gestor, não importa, tratamos todos como iguais. Isso que importa.

Parece que o que mais te marcou então foram mesmo as pessoas que estavam contigo?

Sim. Documentação, papelada, essa área administrativa, a gente acaba aprendendo e resolvendo. Só que os laços fortes que você cria ali dentro transcendem tudo isso.

O que o IFMS representa para você hoje?

O Instituto é um órgão extremamente relevante e necessário. A qualidade do ensino é surreal, os laboratórios são equipados. Para mim, o IFMS é uma fonte de riqueza intelectual sem precedentes. Trabalhar em um ambiente desse é uma honra. Eu desconhecia esse fato até estar lá dentro. Ele fornece pra mim tudo que eu necessito, porque é através desse trabalho que eu recebo meu ordenado, pago minhas contas, pago o meu plano de saúde, hoje muito necessário pra mim. Sou grata por trabalhar no campus, onde eu tenho fontes de recursos para o que eu preciso.

Sobre seu atual estado de saúde, podemos conversar sobre como tudo isso ocorreu?

Vou te falar no sentido espiritual. Deus foi muito bom pra mim nesse sentido. Porque antes do IFMS, eu não tinha condições financeiras. Depois de um ano, um ano meio que entrei no Instituto, tive um problema no útero, precisei fazer uma cirurgia. Passado um tempo, eu ficava o dia inteiro comendo gelo, o meu organismo só pedia gelo. Aí, a enfermeira me falou para procurar um médico. Eu dava desculpa que estava calor. Em 2016, fui para Marília (SP) de férias e passei muito mal. Fui encaminhada para o hospital, fiz ultrassom, queriam me internar pra eu receber uma bolsa de sangue. Disseram que eu estava com anemia agressiva.  Assinei um termo de que iria procurar um hematologista, para que o hospital me desse alta. Eu queria terminar minhas férias em paz. Olha a cabeça da pessoa!

Depois de um tempo, marquei consulta com um hematologista. Ele me pediu um monte de exames e descobriu o que estava causando a anemia. Eu tinha um câncer no intestino, em uma alça perto do intestino grosso. A única coisa que eu pensei foi: isso vai sair de mim. Uma prima lá de Marília conseguiu me encaminhar para um médico especialista de São Paulo. Em uma semana, esse segundo anjo na minha vida conseguiu abrir as portas para mim. O médico falou para marcarmos a cirurgia. Isso foi em março de 2016. Eu pensei: vou me livrar disso, sou forte, tenho muito que contribuir ainda, tenho meus pais, tenho meu filho, isso não vai me matar, isso não vai me dominar!

Já havia casos de câncer na sua família?

Historicamente, não. Minha preocupação era com a mama. Com 25 anos, fiz uma cirurgia para tirar nódulos mamários. Depois tirei o útero e aí o intestino. Quando terminei essa cirurgia, antes de eu ir embora para casa, o médico me indicou para uma consulta numa clínica oncológica. A médica viu meus exames e me encaminhou para uma quimioterapia paliativa, por seis meses. Ela avisou que meu cabelo não ia cair, que eu ficaria debilitada, mas que era forte e ia aguentar. Pedi afastamento do trabalho e fiz as sessões todas em Marília. Quando eu estava terminando, transferi meu tratamento para Minas Gerais. Foi aí que vim pra Poços de Caldas, onde estou agora realizando uma sessão de quimioterapia.

Em janeiro deste ano, antes de receber alta do tratamento, refiz todos os exames. E o que aconteceu? Apareceu um câncer no estômago. Comecei a fazer outros exames pra ver a extensão do problema. O médico disse que ia tirar meu estômago, parte do esôfago, o baço. Eu falei: vai sobrar alguma coisa? Não tirando meu pulmão, meu coração e meu cérebro, vai tirando tudo isso aí que eu quero ficar boa...

Foi quando as meninas do campus vieram, em abril. Na cirurgia, o médico constatou que todos os órgãos estão tomados. Em menos de trinta dias, o câncer foi do estágio 1 para o estágio 4. Foi um choque. Veio pra cá toda a minha família. Tinha dia que havia 15 pessoas no meu quarto do hospital.

Essa é a história da minha doença, não é fácil não. Oro todos os dias a Deus pedindo meu milagre, que essa dificuldade seja superada, mas não é no meu tempo, é no tempo Dele. O meu caso não tem mais cura. Tenho um problema que a Medicina não pode resolver. Mas eu não quero morrer, quero ficar bem.

Você parece ter muitos planos para o futuro...

Sim. Quero voltar a trabalhar, quero crescer profissionalmente, quero prosperar dentro do Instituto, até onde for possível. Hoje o meu objetivo pessoal é fazer mestrado, agora não tenho condições por conta do meu tratamento, mas meu objetivo é chegar a ter pós-doutorado! Também quero administrar melhor a minha qualidade de vida.

Acredito que nós estamos na Terra para evoluir. E isso que eu penso da vida, dentro do meu trabalho profissional, dentro da minha vida pessoal, agregando ambos os lados.

Essa positividade, esse bom humor que você leva desde sempre, o fato de ser comunicativa... Você acha que tudo isso contribui no seu ambiente profissional e na vida pessoal?

Não estou me qualificando com uma mulher maravilha do mundo não, mas eu consigo fazer amizade com pessoas das quais ninguém gosta. Tem fulano de tal que ninguém conversa, eu chego lá, faço amizade e me dou bem com todo mundo. Claro que há pessoas com quem não simpatizo, mas eu as respeito, admiro e trato com serenidade.

Seus colegas do Campus Nova Andradina falam que você tem uma atitude muito positiva ao lidar com tudo isso. No que você se apega para conseguir se manter assim?

Eu me apego a tantas coisas, mas primeiramente a Deus, Jesus Cristo. Não tenho uma religião definida, tive formação católica, mas já participei de cultos evangélicos, buscando sempre um posicionamento religioso bem forte na minha vida. Também estudo a doutrina espírita, tento entender o que está além das nossas capacidades de conhecimento, busco essas informações. O importante é ter pensamento positivo, acreditar que vai dar tudo certo.

Tenho anjos na minha vida. O que eu não podia fazer por mim, essas pessoas fizeram. Sou grata à minha família, ao meu filho, aos meus amigos, a Deus mais do que tudo porque é através dele que eu tenho essas pessoas em volta de mim. Sou uma pessoa feliz. Tudo isso que me traz alegria.