ENTREVISTA
Marcelina Teruko Fujii Maschio
A vida da servidora Marcelina Teruko Fujii Maschio é do tipo que não pode ser resumida. Aos 51 anos de idade, ela carrega em sua bagagem mais coisas do que se pode contar. Apesar de não se achar uma viciada em estudos, possui no currículo três graduações (Educação Física, Pedagogia e Administração) , cinco especializações, além do mestrado e doutorado em Educação.
São 31 anos de carreira como professora, 23 deles na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. Em 2008, aceitou o desafio de auxiliar na implantação do IFMS e daqui nunca mais saiu. Assumiu a Pró-Reitoria de Ensino e Pós-Graduação, e no ano passado foi convidada a assumir a Diretoria Executiva da reitoria, cargo que atualmente ocupa.
Durante a entrevista, a bem-humorada Marcelina, natural do interior do Paraná e filha de imigrantes japoneses, conta o que Mato Grosso do Sul tem de especial e o que gosta de fazer no seu tempo livre. A lista inclui artesanato e pintura. Ela também fala sobre o significado do Instituto em sua vida e quais as mudanças que a educação profissional pode realizar na vida das pessoas.
Você sabia que Marcelina possui o hábito de ler dois livros ao mesmo tempo? Ela também é a única professora titular da instituição, nível mais alto da carreira. Descubra isso e muito mais no bate-papo a seguir!
Como foi seu ingresso na Rede Federal de Educação Profissional?
Via concurso público. Eu já atuava como professora antes de entrar na Rede. Conto que havia feito uma cirurgia no dia da prova de desempenho didático e fui fazê-la toda machucada. Acabei sendo aprovada em primeiro lugar na minha área há 23 anos, e bastante coisa aconteceu nesse período.
Como surgiu a oportunidade de vir para o IFMS?
Foi um convite. Eu estava no Centro Federal de Educação Profissional. Era o então “Cefet” que se transformou em Universidade Tecnológica (Federal do Paraná). Daí veio o convite para ajudar na implantação do IFMS. Quando cheguei aqui ainda era Escola Técnica Federal, em 2008, não tínhamos a lei de implantação, a 11.892, que foi publicada só em dezembro. Então, começamos a discutir essa configuração de instituto antes da própria lei de criação.
Como foi o processo de implantação?
Foi desafiador. Eu acho que foi um presente participar desse projeto, porque me permitiu estudar, ler muito, conhecer outros modelos, principalmente, internacionais. Em termos de Brasil, esse modelo do Instituto é “sui generis”. Precisávamos buscar referências, não que fôssemos copiar nada de fora, mas era preciso verificar qual seria o melhor modelo de educação profissional para o Brasil.
A senhora esteve à frente da Pró-Reitoria de Ensino desde o começo. Como foi a instalação dos campi e a definição dos cursos?
Foram feitas algumas audiências públicas nos municípios, então conversamos bastante com o executivo municipal e secretários da época. Tivemos um diálogo muito intenso para discutir a oferta de cursos do Instituto. Foi um grande desafio, realizamos tudo na tentativa de fazer o melhor para os cidadãos.
O que o Instituto representa na sua vida?
O IFMS é a edificação de um ideal. Pode até parecer piegas, mas acho que esse é o sonho de muitos aqui, que esse projeto dê cada vez mais certo. Temos pessoas comprometidas e com muito potencial. É um sonho em que a gente acredita.
O que a senhora espera para o futuro do Instituto? O que vê para daqui cinco anos?
Primeiro, acredito que é a nossa consolidação e a dos cursos técnicos. Temos um espaço a ser conquistado, principalmente na inserção sócio-profissional. Até as pessoas entenderem que um aluno menor pode entrar no setor de produção de uma empresa leva um tempo.
Verificamos a importância que tem esse profissional nos estados que possuem instituições centenárias. Nos países desenvolvidos, muitas pessoas optam pelo profissional técnico, que o remuneram muito bem. Entretanto, aqui ainda não é tão reconhecido.
O superior de tecnologia também tem um grande espaço a ser conquistado. Acredito que estamos no caminho certo, temos tido êxito, tanto por parte de olímpiadas educacionais, quanto por parte da pesquisa, do estágio, por exemplo. É uma questão de tempo.
É visível a sua paixão pela Rede Federal de Educação Profissional. A senhora acha que a Rede e a educação profissional são capazes de mudar a vida das pessoas?
Nós temos o hábito de achar que apenas um bacharelado é capaz de fazer a inserção profissional das pessoas. Não entendemos até que ponto um curso técnico, um FIC (formação inicial continuada), uma qualificação profissional pode mudar a vida das pessoas.
Eles podem dar condições para que a pessoa tenha a primeira inserção e depois comece a verticalizar. Então, o estudante faz uma qualificação, e depois cursa o técnico. Do técnico, faz um superior, uma pós-graduação e consegue fazer o seu itinerário formativo por meio da educação profissional.
Não se trata de subemprego, que gera subsalário. É a autonomia do cidadão por meio do trabalho. São dois direitos básicos do ser humano, que é o direito à educação e é o direito ao trabalho. Direitos constitucionais que a educação profissional propicia. O trabalho realmente é necessário, que junto com a educação, pode dar autonomia ao povo brasileiro. Acredito na educação profissional. É o nosso caminho.
Sempre quis ser professora ou simplesmente aconteceu?
Logo que completei vinte anos, terminei minha primeira graduação. A idade que normalmente estamos entrando em uma faculdade, eu já estava saindo. Achei que deveria continuar estudando, e fui presenteada em ser professora na escola que havia estudado. Ser professor é algo que apaixona.
É apaixonante você sentir que pode mudar a vida das pessoas, não só com aquilo que ensina, mas pelos valores que passa, pelos conselhos, pela amizade que demonstra em uma sala de aula. Passei a ser professora e continuei estudando. Pensar na profissão de professor é algo que encanta, porque você sente orgulho do sucesso dos seus alunos.
A educação profissional ainda tem um adicional. Quando foi criada, em 1909, era para os desafortunados, os desvalidos da sorte, a educação para o filho do trabalhador. Entretanto, você percebe que a pessoa consegue mudar a história dela e de toda família por meio da educação profissional.
No geral, esses alunos podem ser os primeiros de uma família que conseguem fazer um curso superior ou uma pós-graduação. Nós não ensinamos apenas uma profissão. O que muda tudo no Instituto é a base científica que ancora o conhecimento tecnológico. Isso faz toda a diferença no Instituto Federal.
A senhora veio primeiro provisoriamente e recentemente pediu redistribuição para o IFMS. Por que decidiu permanecer aqui em Mato Grosso do Sul? O que mais gosta em nosso estado?
É um estado acolhedor. Só de termos essas araras e tucanos nos presenteando todos os dias é maravilhoso. Há muitas possibilidades, eu falo isso para os meus filhos, que ainda são bastante jovens. É um estado muito promissor.
Quantos filhos a senhora tem?
Um casalzinho. Tem 14 e 16. A menina é a mais velha.
A senhora já foi vista lendo dois livros ao mesmo tempo? Isso é verdade?
Verdade. Eu adoro ler dois livros ao mesmo tempo. Força o raciocínio, a memória... Eu leio um pouquinho, daí fecho e leio outro. Eu vou lendo simultaneamente. São ideias... os livros se conversam, eles se relacionam.
O que você faz no seu tempo livre? Ouvi dizer que a senhora gosta de pintar...
Eu pinto, eu adoro artesanato, leitura, música. Eu sou muito fácil de agradar. Eu gosto de muitas coisas. Adoro viajar, fazer croché, tricô, bijuteria, bordar chinelo.
O que a senhora pensa em fazer a partir de agora? Ou depois de se aposentar?
A maior conquista na carreira é ser professor titular*. Professora titular é uma pessoa que tem cinco anos de doutorado e tem que estar no último nível da carreira há mais de cinco anos. Para concorrer, preciso escrever o meu memorial com todos os documentos da minha trajetória profissional e submeter à banca para que possam analisar se tenho ou não condições de ser titular. Ou então, escrevo uma tese e a defendo. Acho que sou a única do Instituto que é professora titular.
Eu também estou pensando em fazer Direito, o pessoal aqui já morreu de rir... Desde 2014 já podia ter me aposentado, daí vou deixando... pelo menos assim poderei trabalhar meio período em algum lugar e cuidar mais das minhas “crianças” .
*Marcelina tornou-se professora titular no ano passado e a banca foi no Paraná.